Palavras aos monges
novembro 18, 2011Palavras aos monges
VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA BENTO XVI
À ÁUSTRIA POR OCASIÃO DO 850º ANIVERSÁRIO
DA FUNDAÇÃO DO SANTUÁRIO DE MARIAZELL
DISCURSO DO SANTO PADRE
AOS MONGES REUNIDOS
NA ABADIA DE HEILIGENKREUZ
Domingo, 9 de Setembro de 2007
Reverendíssimo Dom Abade
Queridos Irmãos no Episcopado
Queridos monges cistercienses de Heiligenkreuz
Estimados irmãos e irmãs de vida consagrada
Ilustres hóspedes e amigos do Mosteiro e da Academia
Senhoras e Senhores!
Na vida dos monges a oração tem uma especial importância: é o centro da sua tarefa profissional. Eles, de fato, exercem a profissão do orante. Na época dos Padres da Igreja, a vida monástica era qualificada como vida à maneira dos anjos. E como característica fundamental dos anjos via-se o seu ser adoradores. A sua vida é adoração. Isto deveria ser válido também para os monges. Eles rezam antes de tudo não por esta ou aquela coisa, mas simplesmente porque Deus merece ser adorado. "Confitemini Domino, quoniam bonus! Celebrai o Senhor, porque ele é bom, porque eterna é a sua misericórdia!", exortam vários Salmos (por ex. Sl 106, 1). Uma oração assim sem uma finalidade específica, que deseja ser puro serviço divino é com razão chamado "officium". É o "serviço" por excelência, o "serviço sagrado" dos monges. Ele é oferecido a Deus trino que, acima de tudo, é digno "de receber a glória, a honra e o poder" (Ap 4, 11), porque criou o mundo de modo maravilhoso e de maneira ainda mais maravilhosa o renovou.
Ao mesmo tempo, o officium dos consagrados é também um serviço sagrado aos homens e um testemunho para eles. Cada homem tem no íntimo do seu coração, consciente ou inconscientemente, a nostalgia de uma satisfação definitiva, da máxima felicidade, portanto, no fundo a nostalgia de Deus. Um mosteiro, no qual a comunidade se reúne várias vezes ao dia para louvar a Deus, testemunha que este originário desejo humano não cai no vazio: o Deus Criador não nos colocou nas trevas assustadoras onde, às apalpadelas, deveríamos desesperadamente procurar um sentido último fundamental (cf. Act 17, 27); Deus não nos abandonou num deserto do nada, privado de sentido, no qual, em última análise, nos espera apenas a morte. Não! Deus iluminou as nossas trevas com a sua luz, por obra do seu Filho Jesus Cristo. N'Ele, Deus entrou no nosso mundo com toda a sua "plenitude" (cf. Cl 1, 19), n'Ele toda a verdade, da qual sentimos saudade, tem a sua origem e o seu ápice (cf. Concílio Vaticano II, Gaudium et spes, n. 22).
A nossa luz, a nossa verdade, a nossa meta, a nossa satisfação, a nossa vida tudo isto não é uma doutrina religiosa, mas uma Pessoa: Jesus Cristo. Muito além das nossas capacidades de procurar e de desejar Deus, antes já fomos procurados e desejados, aliás, encontrados e remidos por Ele!
O olhar dos homens de todos os tempos e povos, de todas as filosofias, religiões e culturas encontra por fim os olhos abertos do Filho de Deus crucificado e ressuscitado; o seu coração aberto é a plenitude do amor. Os olhos de Cristo são o olhar do Deus que ama. A imagem do Crucificado sobre o altar, cujo original romano se encontra na Catedral de Sarzano, mostra que este olhar se dirige para cada homem. O Senhor, de facto, vê no coração de cada um de nós.
O cerne do monaquismo é a adoração o viver como os anjos. Contudo, sendo os monges homens de carne e sangue nesta terra, São Bento ao imperativo central do "ora" acrescentou outro: o "labora". Segundo o conceito de São Bento como também de São Bernardo, uma parte da vida monástica, juntamente com a oração, é também o trabalho, a cultivação da terra em conformidade com a vontade do Criador. Assim, em todos os séculos os monges, partindo do seu olhar dirigido para Deus, tornaram a terra vivível e bela. A salvaguarda e o cuidado da criação provêm precisamente do seu olhar para Deus. No ritmo do ora et labora a comunidade dos consagrados dá testemunho daquele Deus que em Jesus Cristo olha para nós, quer para o homem quer para o mundo que, olhados por Ele, se tornam bons.
Não só os monges dizem o officium, mas a Igreja inspirou-se na tradição monástica a recitação do Breviário para todos os religiosos, e também para sacerdotes e diáconos. Também aqui é válido que as religiosas e os religiosos, os sacerdotes e os diáconos e naturalmente também os Bispos na quotidiana oração "oficial" se apresentam diante de Deus com hinos e salmos, com agradecimentos e pedidos sem finalidades específicas.
Queridos irmãos no ministério sacerdotal e diaconal, estimados irmãos e irmãs na vida consagrada! Eu sei que é necessária disciplina, aliás, por vezes até a superação de si para recitar fielmente o Breviário; mas mediante este officium recebemos ao mesmo tempo muitas riquezas: quantas vezes, ao fazer isto, cansaço e desencorajamento dissipam-se! Onde Deus é louvado e adorado com fidelidade, não falta a sua bênção. Com razão se diz na Áustria: "Tudo depende da bênção de Deus!".
O vosso principal serviço para este mundo deve portanto ser a vossa oração e a celebração do Ofício. A predisposição interior de cada sacerdote, de cada pessoa consagrada deve ser a de "nada antepor ao Ofício divino". A beleza desta predisposição interior expressar-se-á na beleza da liturgia, a ponto que onde juntos cantamos, louvamos, exaltamos e adoramos Deus, torna-se presente na terra um pouco de céu. Deveras não é exagerado dizer que numa liturgia totalmente centrada em Deus, nos ritos e nos cânticos, se vê uma imagem da eternidade. De outra forma, como teriam podido os nossos antepassados há centenas de anos construir um edifício sagrado tão solene como este? Já a arquitectura só por si atrai para o alto os nossos sentidos para "aquelas coisas que nenhum olho viu, nenhum ouvido ouviu, nem jamais passou pelo pensamento do homem, o que Deus preparou para aqueles que O amam" (cf. 1 Cor 2, 9). Em cada forma de empenho pela liturgia o critério determinante deve ser sempre o olhar dirigido para Deus. Nós estamos diante de Deus Ele fala-nos e nós falamos com Ele. Quando, nas reflexões sobre a liturgia, nos perguntamos como torná-la atraente, interessante e bela, o jogo já está feito. Ou ela é opus Dei com Deus como sujeito específico ou não o é. Neste contexto peço-vos: realizai a sagrada liturgia tendo o olhar em Deus na comunhão dos Santos, da Igreja vivente de todos os lugares e de todos os tempos, para que se torne expressão da beleza e da sublimidade do Deus amigo dos homens!
Por fim, a alma da oração é o Espírito Santo. Sempre, quando rezamos, na verdade é Ele que "vem em ajuda da nossa debilidade, intercedendo com insistência por nós, com gemidos indescritíveis" (cf. Rm 8, 26). Confiando nesta palavra do apóstolo Paulo garanto-vos, queridos irmãos e irmãs, que a oração suscitará em vós aquele efeito que outrora se expressava chamando sacerdotes e pessoas consagradas simplesmente "Geistliche" (isto é, pessoas espirituais). O Bispo Sailer de Ratisbona disse certa vez que os sacerdotes deveriam ser antes de tudo pessoas espirituais. Gostaria que a expressão"Geistliche" voltasse de novo a ser mais usada. Mas contudo é importante que se cumpra em nós aquela realidade que a palavra descreve: que no seguimento do Senhor, em virtude da força do Espírito, nos tornemos pessoas "espirituais".
Monges da Divina Misericórdia
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